quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Poste que fala...

Não mostrem à Regina Duarte o discurso de Dilma Rousseff no Congresso do PT. Para quem tinha medo de Lula, o trauma poderá ser insuperável. Nem tanto pelas palavras proferidas pela pré-candidata a presidente. A retórica estadista de porta de assembléia já é conhecida, misturando realidade e ficção para servir a velha laranjada ideológica.

O que pode levar Regina ao pânico é a evolução cênica, a postura, enfim, a pré-candidata em si.
Durante quase uma hora de discurso, quem se imaginou num país dirigido por aquela senhora ficou, no mínimo, mareado. Sua movimentação de braços, excessiva e a esmo, parecia tentar domar o volante de um carro desgovernado.

Acompanhar a expressão corporal e facial da ministra era, de fato, um exercício estonteante. Nada combinava com nada. Tentativas de sorriso duelavam com gestos bruscos, palavras medidas para dar informalidade saíam em tom categórico, o olhar se fixava criteriosamente no nada. A militância petista estava lá para urrar por Dilma. Não deu. Catatônica, a claque não conseguiu reagir ao poste falante.

O único fato verdadeiramente comovente do comício era o desconforto da candidata em público, talvez enfastiada da sua própria falsidade. Um bom leitor de almas diria que ela estava doida para saltar daquele carro, rasgar a fantasia e assumir o que estava escrito na sua testa: “Socorro. Não sei dirigir esse troço.”

O contraste entre o olhar perdido e o tom peremptório ficava um pouco mais agudo quando Dilma mentia – o que não deixa de ser um indicador de honestidade, mesmo que temporariamente suspensa.

Quando afirmou, por exemplo, que o Brasil se safou da crise porque os brasileiros impediram privatizações como as da Petrobras e do Banco do Brasil, o automóvel arisco de Dilma parecia que ia sair da estrada. Enquanto recitava o samba do chavista doido, seus braços pareciam tentar a manobra impossível que a salvassem do desastre verbal.
Quando teve que prometer mais cabides para a companheirada, falando em continuar a “reaparelhar” o Estado, seus olhos pareciam pedir, pelo amor de Deus (ou de Lula), um par de óculos escuros.

[Guilherme Fiuza]*Guilherme Fiuza - Jornalista, é autor de Meu nome não é Johnny, que deu origem ao filme. Escreveu também os livros 3.000 Dias no Bunker, reportagem sobre a equipe que combateu a inflação no Brasil, e Amazônia, 20º Andar, a aventura real de uma mulher urbana na floresta tropical. Em política, foi editor de O Globo e assinou em NoMínimo um dos dez blogs mais lidos nessa área.

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