terça-feira, 27 de julho de 2010

Para entender Bruno...

Para entender Bruno, o goleiro, é inevitável entender Bruno, o psicopata. Psicopatia, como se sabe,não é psicose, como são as esquizofrenias, os distúrbios bipolares, por exemplo. Trata-se de um transtorno do caráter. Usualmente é entendido como sinônimo de delinqüência e ponto. Não é tão simples assim.

A entrada da pessoa na cultura, uma forma de nascimento social, depende fundamentalmente da internalização de uma sofisticada Lei da maioria que surgir como uma interdição no momento que Freud batizou de Complexo de Édipo e a função do Superego. Esta instância é o lugar do limite, da Lei, do Não. Na ausência completa do Não o Sim não existe.

A rede social em seu imaginário cria e cultua modelos de ética e moral a partir da lei familiar do significado desta palavra “Não” imposto em sua instância fundamental pela proibição do incesto e outras aplicações, um dever e um impedimento que se transmite por todas as vias de comunicação, sem o que a civilização não seria possível e a fragilidade da raça humana não sobreviveriam.

Tal ordem garante a rede, que garante a vida. Dependemos uns dos outros, cada um no seu pedaço para mantermos um sistema de sobrevivência. A raça humana é frágil, susceptível a qualquer doença e para a mínima produção necessita de famílias organizadas em funções. Estas se mantêm através da lei cuja mãe é: fica proibida a relação sexual ou reprodução dentro da mesma família. E por aí vai.

Alguns se excluem ou são excluídos desta organização legal, aliás, enfatizada nos Dez Mandamentos e suas metáforas.

O que ocorre então quando alguém se vê desprovido de tal sistema mental, moral ético? Já lhes digo: cria por conta própria sua legislação. Funda um amontoado de regras que não reconhecem ou respeitam o outro. Não existe o semelhante, por assim dizer.

Nasce um psicopata.

Tudo o que a sua inteligência, desejo e instinto ordenarem, para levar-lhe ao prazer ou ao alívio prazeroso da dor ou da frustração da dor é legal na sua constituição. Não há culpa, não há alma, só uma modalidade perversa de gozo e uma conseqüente e patológica sensação de onipotência. E agem dentro desta lei não compartida sequer pelos próprios psicopatas. Por isso não se organizam como força unida, o que convenhamos é um alívio. Impregnam-se de lógicas individuais que não devem explicações a ninguém, nem a eles próprios;

O resto vem por conta. Grupos extra ou intra familiares, que tiram do próprio umbigo as regras sociais e mesmo a lógica, escondem-se em uma modalidade bizarra de necessidade ou da ignorância diante da impotência de uma sociedade que não é suficientemente estética para impor pelo bem, a Lei Única citada. Os mandamentos estéticos, as virtudes, tudo isso passa longe, muito longe de seus insólitos psiquismos auto credenciados a qualquer coisa que seja. Tal patologia não é privilégio: ocorrer nas melhores famílias. Basta a Lei não exista ou não seja suficientemente eficaz em todas as suas vertentes.

Este buraco negro da psicopatologia cria um impasse social. Como se vê em milhões de “casos Bruno” em todo o mundo em todos os tempos uma coisa é certa: não podemos nos furtar a um exercício emergencial: pensar.


Paulo Bonates
O autor é médico psicanalista

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